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Alta de preços pressiona os custos das concessionárias de rodovias e ferrovias

Fonte: Estadão (18 de abril de 2022)

Concessões públicas de serviços de transporte, como de ferrovias, podem passar por onda de pedidos de reformulação de contratos Foto: Agência Pará

 

BRASÍLIA –  As concessões públicas de serviços de transporte, como de rodovias e de ferrovias, podem passar por uma onda de pedidos de reformulação de contratos que, na prática, pode levar a reajustes das tarifas de pedágios, adiamento de investimentos ou prorrogação dos contratos. O que ameaça esses negócios, de acordo com as empresas do setor, é o patamar alto e persistente dos preços dos insumos, como asfalto e cimento, utilizados nos projetos que, elevados desde 2021, não dão sinais de trégua neste ano. As concessionárias ainda estudam detalhadamente os impactos para recorrerem às agências reguladoras.

 

O óleo diesel acumula alta de 46,47% em 12 meses e o preço do asfalto subiu 68,33% de outubro de 2020 a dezembro do ano passado, o que tem efeito direto na cadeia de suprimentos das concessionárias de rodovias, diante da obrigação de investimentos em obras. Para o setor de ferrovias, o cimento e o aço igualmente entram na conta.

 

Segundo Marco Aurélio de Barcelos, presidente da ABCR, associação que representa as empresas do ramo, o aumento dos insumos está comprometendo a execução dos contratos, e começa a colocar a sustentabilidade financeira dos projetos em xeque. Isso porque há um descolamento do preço desses insumos e o IPCA, o índice oficial de inflação do País, que é usado para reajustar os valores das concessões em andamento.

 

Além disso, uma série de eventos tem apontado que a acomodação dos preços é incerta nos próximos meses. Além da inflação galopante, a guerra na Ucrânia e o crescimento de casos da covid-19 na China adicionam um grau de incerteza à cadeia de suprimentos, que já atravessa uma crise desde o ano passado.

 

A ABCR e a Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários (ANTF) tentarão convencer o poder público de que o aumento de preços é extraordinário e não poderia ser previsto, por isso há a necessidade de recomposição dos negócios. “Essa é a questão que queríamos construir em conjunto com a ANTT”, afirmou Barcelos, destacando que também será preciso debater sobre a melhor forma de reequilibrar os contratos, sem necessariamente ser pela via tarifária. “Entre hipóteses existe a reprogramação de investimentos, a ampliação do prazo do contrato, por exemplo. Aqui a criatividade precisa ser exercida para se alcançar um ponto ótimo”, disse o presidente da ABCR.

 

Procurada, a ANTT disse que acompanha a questão e que “vem dialogando com as concessionárias e entidades ligadas às rodovias concedidas”. “Mas ainda não houve pedido formal de análise de reequilíbrio”, afirmou.

 

A ANTF traça uma agenda similar à da ABCR, mas com particularidades do segmento ferroviário. Diretor-executivo da associação, Fernando Paes disse que as concessionárias de ferrovias têm ainda uma segunda demanda junto à ANTT, além de eventuais recomposições nos contratos.

 

O setor quer propor uma fórmula de parametrização para os avanços do preço do diesel, que delimite até que ponto a variação para cima é jurídica e economicamente viável para o concessionário suportar como risco próprio.

 

“Se houver um balizamento comum que oriente a área técnica, vai poder reconhecer o momento em que o diesel extrapolou e que será necessário dar uma resposta tempestiva”, disse Paes.

 

Governo defende análise caso a caso

O governo federal vem tratando o impacto dos insumos nas concessões com bastante cautela. A avaliação é de que existe uma diferença entre o patamar alto das matérias-primas e a queda brusca da demanda que marcou a pandemia – situação em que o governo reconheceu como extraordinária, facilitando os pedidos de recomposição dos contratos.

 

“Em termos de política pública, se vemos a necessidade de uma manifestação como tivemos na época da covid [parecer reconhecendo evento extraordinário]? Não, não vejo”, disse ao Estadão/Broadcast a secretária de Planejamento, Desenvolvimento e Parcerias do Ministério da Infraestrutura, Natália Marcassa.      

 

Ela reconhece o descolamento da inflação dos insumos usados pelo setor e a inflação do consumidor. Mas avalia também que os efeitos disso não devem ser tratados horizontalmente em todos os contratos. Por exemplo, se uma concessão já passou da fase de obras de pavimentação, o preço do asfalto não faz mais diferença para o caixa da empresa que administra a rodovia. Portanto, para a secretária, o contexto atual pode apenas gerar uma avaliação caso a caso.

 

“Temos impacto real, e na maioria dos contextos essa paridade vai ocorrer ao longo dos próximos anos. Isso sempre acontece, para cima e para baixo. Acho que é um risco que o poder privado tem condições de alocar. Pode ser que em um momento ou outro do fluxo de caixa esse tipo de acontecimento impacte muito, e aí sim tenha que ser recomposto o equilíbrio, mas eu acho que é uma questão caso a caso e de momento do contrato de concessão”, avaliou Marcassa.

 

Imprevisível

Diretor-executivo da Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários (ANTF), Fernando Paes defendeu que a crise na cadeia de suprimentos decorrente da pandemia, responsável pela inflação alta das matérias-primas usadas no setor, é um fator que as concessionárias não teriam como prever.

 

No segmento de ferrovias, além da repercussão direta do diesel na operação, Paes destacou que o preço dos insumos afeta o valor de obras do setor, que tem vivido uma nova fase com leilões recentes – como da Ferrovia Norte-Sul e Fiol – e renovações contratuais. “O aumento dos insumos impacta na veia o valor das obras. E agora esse descolamento saiu de qualquer previsão”, afirmou o diretor-executivo da ANTF.

 

Segundo as concessionárias, dados do fim de 2021 mostram que, para o material rodante ocorreram reajustes de 10% para componentes de sinalização, de 35% a 40% para rodas de vagões e de 70% a 80% para rodas de locomotivas. Os eixos estão quase 50% mais caros.