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Estatais poderão prorrogar contratos só com privatização

Fonte: Valor Econômico (17 de julho de 2020)

Concessões do BNDES não serão afetadas por vetos, diz o diretor Fábio Abrahão — Foto: Leo Pinheiro/Valor


 
A nova lei do saneamento traz uma brecha para que companhias estaduais possam prorrogar seus contratos, mas apenas em caso de privatização, segundo advogados e analistas de mercado. A versão final do texto foi publicada ontem e causou forte reação política em Brasília. A renovação dos contratos das companhias públicas está no centro de um embate entre governo federal e Congresso.
 
A permissão para que as estatais pudessem prorrogar os acordos foi um dos principais pleitos dos Estados durante as negociações. O artigo que autorizava a renovação por um prazo adicional de 30 anos foi incluído em um acordo com os parlamentares para a aprovação do projeto.
 
No entanto, o acordo foi descumprido. Na terça-feira, ao sancionar o novo marco do setor, o presidente Jair Bolsonaro vetou o artigo. Na avaliação do governo, essa medida prolongaria demais o domínio das estatais no mercado, e atrasaria mudanças importantes para ampliar a concorrência e os investimentos.
 
A decisão gerou revolta entre parlamentares e estatais, que agora tentam derrubar o veto.
 
Uma das principais críticas à restrição foi que, sem a possibilidade de renovar os contratos, as companhias perderiam valor de mercado, e mesmo aquelas interessadas em projetos de desestatização seriam prejudicadas.
 
Na prática, se for mantida, a restrição não afetará as companhias estaduais que forem vendidas, afirmam advogados. Isso porque o artigo que trata sobre a alienação do controle de estatais prevê uma possibilidade de repactuação dos contratos, o que permitirá a mudança de cláusulas e a prorrogação dos prazos. Neste caso, os contratos deixarão de ser deixarão de ser contratos de programa e passarão a ser contratos de concessão.
 
“Não faria sentido privatizar uma empresa sem permitir a reestruturação dos contratos com os municípios. A extensão dos prazos vai permitir que o privado consiga operar o ativo no longo prazo”, afirma Fernando Vernalha, sócio da VGP Advogados.
 
No caso da Sabesp, que é a principal candidata do setor a uma privatização, essa repactuação seria importante para a valorização da empresa e para garantir que todos os investimentos necessários sejam feitos, avalia Carolina Carneiro, do Credit Suisse.
 
Para o UBS, é importante que a companhia paulista consiga repactuar seus 20 maiores contratos – que, juntos, representam 76% da receita do grupo. Só o contrato com a capital, que tem mais 20 anos de validade, responde por 50% do faturamento.
 
A avaliação é que, como as cidades menores são subsidiadas pelas maiores, será preciso renovar apenas as grandes e, naturalmente, as demais prefeituras seguirão o mesmo caminho, segundo os analistas Giuliano Ajeje e Guilherme Reif.
 
Se no caso das privatizações a prorrogação está liberada, o mesmo não ocorre nas concessões ou aberturas de capital sem perda de controle. Nestes casos, a renovação segue proibida pelo veto presidencial – a não ser, claro, que este seja derrubado.
 
Isso não significa, porém, que as concessões serão travadas. No caso dos projetos em estruturação pelo BNDES, por exemplo, não haverá qualquer impacto desse veto, segundo Fábio Abrahão, diretor de Infraestrutura, Concessões e PPPs do banco de fomento.
 
“Há modelos de concessão em que a figura da estatal continua existindo, por exemplo, para atuar na produção de água. É o caso da Cedae [estatal do Rio de Janeiro] e da Casal [de Alagoas], onde essa questão já foi resolvida. Os projetos vão sair neste ano. No demais projetos, como o do Acre e o do Amapá, a relação é entre o Estado e o município, não passará pela estatal”, explica.
 
Para ele, o impacto da sanção da lei será basicamente trazer mais segurança jurídica aos projetos. Abrahão diz ainda que, além da atual carteira do banco, já há negociações com outros quatro estados do Norte e Nordeste para novas desestatizações, que já poderão incorporar os blocos regionais previstos na lei.
 
A expectativa é que, mantido o veto, há um estímulo maior aos projetos de concessão firmados diretamente entre o Estado e os blocos de municípios, sem incluir as empresas estaduais. “As alternativas de desestatização continuam existindo, o continuam existindo, o que não haverá mais é a possibilidade de a estatal ganhar receita com isso”, diz Gustavo Magalhães, do Fialho Salles.
 
Outra alternativa que tem sido estudada pelos governos é a abertura de capital. Para Carolina, do Credit, essa possibilidade segue aberta. Porém, sem a renovação dos contratos, o preço das ações será mais baixo.
 
“As companhias vão ter que se esforçar para criar metas de eficiência e governança para compensar essa perda. Os Estados terão que avaliar uma abertura de capital com alienação do controle, ou então terão que passar por uma forte reestruturação”, diz.