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Em carta a Mourão, CEOs pedem combate ao desmatamento

Fonte: Valor Econômico (08 de julho de 2020)

Walter Schalka, da Suzano: “Temos uma legislação muito positiva, basta aplicar a lei com o rigor necessário” — Foto: Claudio Belli/Valor


 
Líderes de 38 grandes empresas brasileiras e estrangeiras e de quatro entidades setoriais do agronegócio, do mercado financeiro e da indústria enviaram ontem uma carta-manifesto ao presidente do Conselho Nacional da Amazônia Legal, o vice-presidente Hamilton Mourão. No documento, manifestam preocupação com o desmatamento, pedem providências e recomendam que a retomada da economia siga o rumo do baixo carbono. A carta, divulgada com exclusividade pelo Valor, será enviada hoje aos presidentes do Supremo Tribunal Federal, José Antonio Dias Toffoli, da Câmara, Rodrigo Maia, do Senado, Davi Alcolumbre, e ao Procurador-Geral da República, Augusto Aras.
 
É a primeira vez, no governo de Jair Bolsonaro, que líderes empresariais se manifestam coletivamente e pedem ações socioambientais efetivas. Os empresários não acreditam que uma campanha brasileira no exterior vai reverter a situação e alguns dizem que será apenas gasto de dinheiro público. Os termos do documento procuram não ser conflituosos e não confrontar o governo, mas as mensagens são claras.
 

 
Os empresários se declaram preocupados com as reações negativas de investidores brasileiros ao desmatamento da Amazônia, reafirmam seu compromisso com o desenvolvimento sustentável e listam os eixos de ação que consideram fundamentais – do combate “inflexível e abrangente” ao desmatamento ilegal na Amazônia e nos outros biomas brasileiros, à inclusão das comunidades locais e à valorização da biodiversidade.
 
Diz o documento que o grupo “acompanha com atenção e preocupação o impacto nos negócios da atual percepção negativa da imagem do Brasil no exterior em relação às questões socioambientais na Amazônia”. E segue: “Essa percepção negativa tem um enorme potencial de prejuízo para o Brasil, não apenas do ponto de vista reputacional, mas de forma efetiva para o desenvolvimento de negócios e projetos fundamentais para o país”.
 
Pesquisas de imagem do Brasil no exterior indicam a má reputação do governo Jair Bolsonaro com três desdobramentos, na seguinte ordem: o desmatamento da Amazônia, a falta de respeito e apoio aos povos indígenas e à forma como a crise da covid-19 vem sendo enfrentada.
 
Há três semanas, carta assinada por 29 instituições financeiras que gerenciam US$ 3,7 trilhões em ativos alertou o governo brasileiro que ou contém o desmatamento ou enfrentará a dúvida de investidores sobre colocar recursos no Brasil. A lista cresceu. Agora já são 32 investidores com patrimônio alcançando US$ 4,5 trilhões.
 
A sucessão de ameaças à retirada de investimentos, de boicote aos produtos brasileiros e de o acordo Mercosul-União Europeia não decolar acendeu a luz amarela ao empresariado.
 
Recentemente, um empresário líder na exportação de maçãs, de Santa Catarina, declarou em entrevista ao Canal Rural estar encontrando dificuldades em vender a supermercados europeus, em função do desmatamento, e estava buscando novos mercados na Rússia, Índia e até em Bangladesh, cita Marcello Brito, presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), uma das quatro grandes entidades setoriais que assinam a carta.
 
“Há tempos estamos vendo que há uma guinada e que o agro tradicional se descolou completamente do desmatamento do passado. Hoje tem gente ficando muito rica com a criminalidade, a grilagem e a especulação imobiliária na Amazônia. Mas a ligação ainda é muito forte com o agro”, diz Brito. “Infelizmente, apesar dos esforços, não se limpa uma imagem de uma hora para outra, afirma. “Temos que nos movimentar em outra agenda, que interesse ao Brasil. A carta dos empresários é para dizer que estamos aqui para colaborar”, diz.
 
“O Brasil tem uma oportunidade imensa, que tem que ser colocada em perspectiva. Pode se tornar uma grande potência ambiental mundial”, diz Walter Schalka, presidente da Suzano Papel e Celulose.
 
A carta ao Conselho da Amazônia, segundo ele, “é um chamamento para a Nação acordar para esta oportunidade”, continua. Schalka lembra que as matas nativas brasileiras vêm sendo reduzidas e que é preciso combater a ilegalidade. “Temos uma legislação muito positiva, basta aplicar a lei com o rigor necessário. Ao fazer isso, teremos reconhecimento global e podemos monetizar o esforço através de créditos de carbono.”
 
Segundo ele, “o Brasil tinha uma imagem, desde a Rio 92, de estar em um processo de evolução na questão ambiental. Infelizmente, a percepção global não é mais positiva em relação a isso.”
 
Com ele concorda André Clark, presidente da Siemens Energy Brasil. “O Brasil é um campeão de sustentabilidade e precisa continuar a ser.” Ele diz que a captura de carbono, pelas florestas, é uma “grande solução no combate à crise climática, e de baixo custo para o Brasil.”
 
Clark alerta que o mundo, depois da pandemia, dará grande valor para cadeias de valor sustentáveis e que a tendência de rastrear as origens da produção será ainda mais forte. “É a economia da integridade. Consumidores e investidores, cada vez mais, querem cadeias éticas e sustentáveis de valor, que carregam credibilidade, respeitam os direitos humanos e a preservação da natureza.”
 
A iniciativa da carta foi costurada, com cuidado, por Marina Grossi, presidente do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), entidade que reúne 60 grandes conglomerados empresariais nacionais ou com interesses no Brasil. “Era preciso dar voz ao setor privado, mas não em uma situação polarizada. A intenção era separar o joio do trigo”, diz ela.
 
“A Amazônia é uma das maiores riquezas da humanidade e nós, brasileiros, temos a missão de conservá-la”, diz Eduardo Bartolomeo, diretor-presidente da Vale. “A Shell, juntamente com outras grandes empresas, se coloca à disposição para trabalhar junto com o governo no Conselho da Amazônia”, afirma André Araujo, presidente da empresa.