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Advogados trabalhistas pedem adiamento de audiências virtuais

Fonte: Valor Econômico (23 de junho de 2020)

Mayra Palópoli: “Não temos como saber se a testemunha está sozinha” — Foto: Nilani Goettems/Valor


Advogados têm solicitado à Justiça do Trabalho o adiamento de audiências de instrução on-line – fase em que são ouvidas as partes e testemunhas. Preferem esperar pelas sessões presenciais. O argumento é o de que não há segurança sobre o que ocorreria atrás das câmeras. Testemunhas, segundo os profissionais, poderiam ser instruídas, comprometendo toda a lisura do processo.
 
Alguns magistrados têm acatado os pedidos, postergando as datas das audiências. Outros preferem manter as sessões telepresenciais – prática autorizada pelo Ato nº 11, editado pela Corregedoria Geral da Justiça do Trabalho em meio à pandemia de covid-19.
 
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) já concedeu liminar, a pedido da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de São Paulo, contra as audiências virtuais no Tribunal Regional do Trabalho de Campinas (15ª Região) sem a concordância das partes.
 
A advogada Mayra Palópoli, do Palópoli & Albrecht Advogados, não considera a audiência de instrução telepresencial segura. No fórum, afirma, a testemunha fica em outra sala, sem saber sobre os depoimentos do reclamante e do preposto da empresa. Ela ainda tem que prestar depoimento espontaneamente, sem poder ler nada em papel ou ser auxiliada por advogado.
 
“Na audiência telepresencial não temos como saber se a testemunha está sozinha. Se está sendo orientada por alguém ou se está lendo algo escrito”, diz Mayra. Em um processo em que ela atua, acrescenta, o advogado da outra parte entrou com o pedido de adiamento.
 
Ao analisar o caso, o juiz Saulo Caetano Coelho, da 52ª Vara do Trabalho de São Paulo, deferiu o pedido (processo nº 1001645-41.2019.5.02.0052). Ele aceitou a alegação da parte de que não teria condições técnicas para assegurar a participação de suas testemunhas na audiência, pelo fato de não possuir os equipamentos necessários para conexão à internet nem local adequado à participação de forma isolada. A sessão ficou remarcada para 29 de setembro.
 
O advogado Maurício Pessoa, do Pessoa Advogados, que defende empresas na maioria dos processos, afirma que os trabalhadores tendem a ter uma estrutura mais simples, uma internet menos segura, “o que deixa o processo desigual”.
 
Apesar de compreender que o Judiciário não pode parar em meio à pandemia, ele considera arriscado uma audiência de instrução por teleconferência. “Você não tem controle para saber o que está acontecendo por trás das câmeras. O contato do juiz com as testemunhas tem que ser olho no olho. Essa percepção do juiz pode ficar comprometida por vídeo”, diz ele, que já pediu para adiarem as audiências de instrução em dois processos em que assessora empresas por serem mais complexos.
 
Em um dos casos em que atua, o juiz Leonardo Grizagoridis da Silva, da 59ª Vara do Trabalho de São Paulo, entendeu não ser viável a realização de audiência telepresencial, porque “há de ser assegurada a paridade das armas ao litigantes”. Ele também ressalta que “é essencial à busca da verdade real o controle da produção da prova oral, que fica mitigado quando realizada à distância, de fora das dependências do Poder Judiciário” (processo nº 1001741-35.2019.5.02.0059).
 
A advogada Graciela Justo Evaldt, que assessora trabalhadores, também tem solicitado o adiamento de audiências de instrução. Em um dos seus pedidos, defende um ex-funcionário de um laboratório. A ação foi apresentada em agosto de 2017 e tramita na 27ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro.
 
No pedido (processo nº 010 1223-67.2017.5.01.0027), ela alega que “a excepcionalidade do momento não pode servir de barreira de acesso ao Judiciário, especialmente do empregado, parte hipossuficiente da relação jurídica de emprego.” Com a audiência telepresencial, acrescenta, o trabalhador estaria impedido de estar acompanhado por seus procuradores jurídica de emprego.” Com a audiência telepresencial, acrescenta, o trabalhador estaria impedido de estar acompanhado por seus procuradores.
 
Ao analisar o caso, contudo, a juíza Danielle Soares Abeijon negou o pedido por entender que o prosseguimento da prestação jurisdicional não depende da concordância ou discordância das partes. “Cabe ao juiz dirigir o processo, velando pela rápida solução dos litígios e pelo esclarecimento da verdade dos fatos”, diz ela, acrescentando que “as louváveis preocupações da parte são compartilhadas pelo Judiciário, mas não podem servir de escudo e escora para impedir a atuação desse Poder”.
 
Daniel Chiode, do Chiode Minicucci Advogados, que assessora o laboratório no processo, entende que não há motivo para adiamento. Segundo ele, as audiências telepresenciais funcionam bem. “O mesmo  risco que se corre de haver fraude presencialmente, se corre telepresencialmente. Aliás, pela internet, o juiz poderá rever o depoimento quantas vezes ele quiser para poder tomar sua decisão”, afirma.
 
Existe, segundo o advogado, uma resistência injustificada contra as audiências on-line. “Eu endosso as palavras do corregedor-geral da Justiça do Trabalho, Aloysio Corrêa da Veiga, de que a boa-fé se presume. A ma-fé não é a regra e em nome disso não se pode paralisar tudo”, diz. Para ele, só casos excepcionais não poderiam ser resolvidos virtualmente.