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O esquisitão da firma que almoça sozinho é que está certo

Fonte: Valor Econômico (03 de janeiro de 2020)


Quem nunca se sentiu o esquisitão da firma quando saiu para almoçar sozinho ou preferiu abrir a marmita em cima da mesa e comer ali mesmo, abrindo mão do produtivo networking da hora do almoço? Pode ter sido por pressa, por falta de companhia ou porque estava atrás de sossego. Embora hoje com o celular ninguém fique completamente sozinho em um restaurante.
 
Se você faz parte da turma dos solitários do almoço pode ficar tranquilo porque este talvez seja o melhor caminho para ser mais feliz no trabalho. Um estudo recente conduzido por pesquisadores das universidades de Toronto, Hong Kong e do Texas, mostrou que os profissionais que optam por almoçar com colegas se sentem mais exaustos no fim do dia. Ficar sozinho ajuda a recarregar a energia. Isso porque, segundo a pesquisa, para exercer atividades que envolvem interação social é necessário acionar competências que exigem esforço psicológico. Não dá para relaxar totalmente.
 
Até comer na mesa da firma, segundo os pesquisadores, pode ser menos estressante do que sair em bando para almoçar. A essa altura você pode estar imaginando que esse estudo é exagerado, coisa de americano neurótico que adora comer na mesa de trabalho. Um pouco verdade, talvez. Eu mesma já almocei hambúrguer frio com milkshake derretido em uma mesa cheia de papéis em uma consultoria gringa. Para mim pareceu loucura, mas para eles aquilo era rotina. Alguns profissionais sentem que se pararem para almoçar a produtividade despenca.
 
Para mim, isso sim parece exagero. Buscar uma pausa genuína e descompromissada no meio do expediente me soa mais saudável. Mas como fica o networking do almoço? Escolher significa sempre perder algo. Muitos projetos são costurados e até promoções são discutidas na hora do almoço. Então não dá para abrir mão desse momento todos os dias da semana. Tem que se esforçar um pouquinho.
 
Comer com os amigos do trabalho é mais fácil e divertido. Mas não é sobre isso que estamos falamos. Estou me referindo aos almoços estratégicos, aqueles nos quais existe uma agenda oculta, ou aqueles em que vale ser visto acompanhado de alguém que ajuda a ganhar moral com os colegas. É preciso ter estômago para aguentar, mas esses encontros fazem parte do jogo corporativo e não há como evitá-los se o objetivo é progredir na carreira e entender a cultura da sua organização.
 
Uma amiga, que chamei para almoçar outro dia, me disse que meu convite tinha caído do céu. Ela lidera uma equipe em uma multinacional com um escritório relativamente pequeno, em São Paulo, e não aguentava mais se sentir excluída na hora do almoço. Ela me disse que as pessoas do seu departamento combinavam de sair para comer pelo WhatsApp e, quando ela percebia, tinha todo mundo ido sorrateiramente embora e ela tinha que almoçar sozinha novamente se sentindo a última das criaturas. Por estar no comando, ela também não se sentia confortável para chamar as pessoas para comer para não parecer uma imposição. Eu disse a ela, que era muito provável, que as pessoas tivessem medo de incomodá-la, simplesmente porque ela era a chefe.
 
Para chamar o chefe para almoçar é preciso coragem. Nem todo mundo tem. Alguns dirigentes criam um ambiente favorável para que esse convite aconteça de forma casual, mas isso não é o mais comum. Quando você é chefe, como a minha amiga, é difícil tomar a iniciativa sem parecer que o convite é uma obrigação. Dizer não para o chefe, por outro lado, é arriscado e pode soar antipático, mesmo que você tenha acabado de comer um sanduíche triplo na sua mesa.
 
Então, na firma a dica é equilíbrio. Almoce um dia com um colega amigo, outro com alguém que possa se tornar um parceiro de projetos ou que te coloque a par das fofocas da empresa e reserve mais um para encontrar clientes e fornecedores. Se estiver com pressa de sair cedo para aproveitar a vida longe do escritório sinta-se à vontade para comer rápido no self-service da esquina ou até para engolir algo na mesa mesmo, apenas não faça aquela bagunça constrangedora ou traga peixe e mexerica de sobremesa, porque nenhum colega precisa disso.
 

 
Stela Campos é editora de Carreira, coeditora dos anuários Executivo de Valor e Valor Carreira. Autora do Guia Valor Econômico de Desenvolvimento Profissional.