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Argentina eleva impostos para evitar déficit maior

Fonte: Valor Econômico (17 de dezembro de 2019)

O ministro da Economia, Martín Guzmán, convocou entrevista coletiva para hoje para anunciar o pacote de medidas — Foto: Mariana Greif/Reuters


O presidente Alberto Fernández enviará hoje o primeiro pacote de medidas econômicas ao Congresso da Argentina. O projeto prevê, entre outras coisas, aumentos de impostos existentes e a criação de uma taxa de 30% para as compras de bens e serviços em dólar. A cotação do dólar paralelo subiu quase 8% ontem chegando a 72,50 pesos.
 
No mercado de ações, os investidores estiveram à espera dos detalhes das medidas, mas a reação foi positiva. O índice Merval fechou com alta de 2,3%, a 37.620 pontos.
 
O projeto de lei, denominado emergência social e integração produtiva, inclui medidas que dão poder ao Executivo de aumentar aposentadorias, pensões e salários e prevê aumentos de impostos para pessoas físicas e jurídicas. Fernández e sua equipe realizaram uma série de reuniões ontem para finalizar os detalhes do pacote.
 
A taxação de 30% das compras de bens e serviços em dólar encarecerá não só as viagens ao exterior como também a contratação de serviços digitais, como Spotify e Netflix, que são muito populares no país. A notícia foi a principal responsável pela alta do cambio paralelo, dada as restrições do governo para a compra de dólar ao cambio oficial de 63 pesos. A medida deve gerar ao governo recursos em torno de US$ 1,5 bilhão, segundo estimativas do mercado.
 

Fonte: BCRA e Cotización Dolar. Elaboração: Valor Data


 
No sábado, o governo publicou decreto que eleva os impostos para exportações do setor agroindustrial e dobra o valor da indenização para demissões sem justa causa. O decreto não foi comunicado pelo governo às instituições do setor agropecuário. A comunicação falha do decreto gerou confusão e conflito com os líderes do setor, já que o agronegócio perderá US$ 1,8 bilhão com as novas alíquotas das chamadas retenções.
 
Em alguns municípios, ruralistas realizaram protestos e fizeram ameaças de endurecimento. Mas o presidente da Sociedade Rural, Daniel Pelegrina, disse ao Valor que, embora o clima seja tenso, não há ainda uma intenção de travar uma batalha como a vivida em 2008 com o governo de Cristina Kirchner. Ele alertou, porém, que o campo é o único setor capaz de garantir a entrada de divisas para a Argentina pagar sua dívida. “Se não tivermos rentabilidade, a produção pode cair, claro”, disse.
 
O presidente da Federação Agrária, Carlos Achetoni, afirmou que o problema mais grave é com “os pequenos e médios produtores, sufocados por impostos, seca e falta de crédito”. Para ele, o governo tem de dar tratamento diferente, com taxação variável conforme o tamanho da produção.
 
Ambas as medidas visam manter o déficit fiscal primário em 0,5% do PIB, afirmou o chefe de Gabinete, Santiago Cafiero, em entrevista ao jornal “La Nación”. O equilíbrio do déficit é parte da negociação do ministro de Economia, Martín Guzmán, com o Fundo Monetário Internacional (FMI) e os credores privados para evitar uma moratória desordenada da dívida argentina de US$ 100 bilhões.
 
Guzmán defende que o plano macroeconômico da Argentina tem de embutir a capacidade do país de pagar a dívida. Ele deverá dar uma entrevista coletiva hoje pela manhã para oferecer detalhes das medidas econômicas.
 
O pacote deveria ter sido enviado ontem ao Congresso, mas o fechamento do texto final acabou atrasando. Houve várias versões sobre seu conteúdo e nenhum comunicado oficial. Ontem, no final da tarde, a Casa Rosada anunciou uma redução de 8% e congelamento de preços dos medicamentos, após uma reunião de Fernández com a indústria farmacêutica.
 
A forte crise que afeta o país, com uma inflação anual à beira de 55%, deixou idosos com aposentarias e pensões defasadas e sem capacidade de comprar medicamentos. Baixar os preços era um compromisso de campanha de Fernández, que colocou como principal meta de seu governo o combate á fome e pobreza, que atinge a 40% da população, segundo dados do O Observatório da Dívida Social da Universidade Católica.
 
“Obviamente só vamos poder avaliar bem depois que soubermos de todos os detalhes [do pacote]. Até agora estamos vendo sinais contra a produção e dá a sensação de que é mais um plano de esforço inicial que acena para os trabalhadores com vistas a acalmar o clima social”, disse uma fonte do setor produtivo. “Neste contexto de empresas com balanços negativos, mercado interno enfraquecido, medidas como dupla indenização e aumentos de impostos vão fazer com que ninguém seja contratado neste momento”, destacou a fonte.
 
Ele disse ainda que há urgência do governo para emitir sinais políticos em duas vias: para a questão social, de que vai cuidar da pobreza, e para os mercados e credores, de que quer equilibrar o déficit fiscal. “Se este pacote for confirmado, somado às medidas já anunciadas, vejo que Fernández está querendo mostrar certo compromisso fiscal com a intenção de gerar confiança na capacidade de pagamento da Argentina”, opinou.
 
Segundo a fonte, o principal sinal desse compromisso é “apertar os setores que têm margem para ajustar, mas no médio prazo me parece que tudo isso será ajustado e discutido”.